Neste mês de Fevereiro de 2017, a Revista Cosmopolitan Brasil fez uma reportagem sobre o comportamentao de stalkear outras pessoas e eu fui um dos entrevistados. Confira a entrevista completa:
– A tecnologia afetou a maneira de as pessoas se relacionarem. Como você enxerga o comportamento de seguir os passos do outro on-line (o stalking) para se preparar para um primeiro encontro amoroso? Você acha que isso é positivo ou negativo para o flerte? Por quê? Gostaria que enumerasse os prós e contras do comportamento.
Acredito que há aspectos positivos e negativos. Ter conhecimento prévio sobre a vida do/da pretendente pode ser interessante pois através das informações obtidas nas redes sociais já se conhece uma série de gostos e preferências da outra pessoa, facilitando muitas vezes a possibilidade de um relacionamento mais sério dar certo. Por exemplo, se eu vejo que uma pessoa publica várias fotos sobre viagens contendo cachoeiras, caminhadas em trilhas, acampamento em barracas, fotos de esportes radicais, festas eletrônicas e etc., a partir destas informações já é possível compreender um pouco sobre a forma daquela pessoa viver a vida e, assim, identificar o quanto aquilo me agrada ou não, o quanto temos coisas em comum, além de facilitar o assunto para várias conversas possíveis de ocorrerem num primeiro encontro. Quanto mais informação se tem sobre uma pessoa previamente a um primeiro encontro, mais estamos em condições de nos relacionar com ela de forma mais segura. Por outro lado, uma série de expectativas vão sendo formadas ao se ter acesso a estas informações. Expectativas estas que nem sempre se corroborarão ao se ter contato com o/a pretendente. Além disso, perde-se (pelo menos em partes) um pouco das surpresas de um primeiro encontro, muitas vezes tão gostosas de irem sendo descobertas aos poucos, à medida que as pessoas vão se conhecendo. Ter acesso à informações prévias sobre o/a pretendente pode também reduzir um pouco a naturalidade da interação. Ao mesmo tempo, as ideias preconcebidas que se têm poderão ir sendo reconstruídas de forma positiva ao longo da interação. Ou seja, ter acesso a estas informações pode render boas risadas e bons diálogos também. Portanto, é uma via de mão dupla e creio que o mais importante seja cada um ter consciência de como prefere ir a um primeiro encontro: sabendo ou não informações prévias sobre o/a pretendente e então acessando ou não tais informações.
– Quais são as possíveis motivações para uma stalker?
Insegurança em relação a quais assuntos abordar, em relação a possíveis gostos e preferências muito distintos; evitar perder tempo saindo para conhecer alguém cuja probabilidade de sintonia pareça ser pequena; evitar possíveis gafes ao se abordar certos assuntos; curiosidade sobre o estilo de vida que a pessoa leva; ter uma ideia de quão reservado ou não uma pessoa é (baseado por exemplo em frequência e tipo de postagem é possível ter uma noção disso); curiosidade sobre as amizades do/a pretendente;
– Fazer esta pesquisa prévia é uma forma de chegar mais segura no encontro. Porém, faz parte do primeiro encontro certa insegurança e falta de controle? Tentar controlar pode ser ruim? Por quê?
Sim, faz parte, já que não se conhece a fundo ainda a outra pessoa. Portanto, é natural ficar inseguro/a e tentar controlar geralmente apenas piora a situação, pois perde-se a naturalidade da relação. É importante lembrar que posteriormente, caso um relacionamento sério se configure, cada um vai ter que lidar com o/a parceiro/a do jeito que ele/ela é: com seus trejeitos, medos, inseguranças, qualidades e virtudes. Portanto, tentar controlar a situação pode ser um tiro no pé já que, uma hora ou outra, cada um conhecerá quem realmente o outro é, e se apaixonará ou não pela outra pessoa do jeito que ele/ela é.
– Stalkear pode gerar mais expectativa em uma relação que sequer começou? Por quê? E isto é bom ou ruim?
Pode, pois a pessoa começa a se relacionar com a outra já sensível ao que viu previamente e, principalmente, sensível às expectativas e ideias que formou sobre a outra pessoa. Porém, estas ideias e expectativas inevitavelmente estão impregnadas da forma de pensar e agir dessa pessoa, que podem divergir da forma de pensar e agir do/a pretendente. Portanto, isto pode ser ruim. Aquela máxima “Quando Pedro me fala sobre Paulo, sei mais de Pedro do que de Paulo” se aplica aqui. A pessoa vai para o encontro sensível ao que ela/ele pensou, sentiu e interpretou das fotos e informações a que teve acesso. Acredito que esta situação pode ser boa apenas se/quando as expectativas prévias forem de fato correspondidas.
– Há benefícios reais desta investigação? Quais? O que, na sua opinião, vale a pena tentar descobrir sobre o outro em um primeiro encontro? Por exemplo, o status de relacionamento dele? E o que mais?
Isso é muito pessoal… Há quem queira saber o detalhe do detalhe, há quem queira saber menos. Como eu disse anteriormente, realmente acredito que o melhor seja cada um fazer do jeito que se sente mais confortável.
– E o que não vale a pena saber? Por quê?
Na minha opinião, investigar sobre relacionamentos passados é, geralmente, uma perda de tempo. O que passou, passou! As pessoas mudam, a forma de se relacionar é diferente com cada um com quem nos relacionamos (há semelhanças, claro… mas o contexto envolvido numa relação é sempre diferente em cada relação e isso muda tudo, faz toda a diferença). Acredito que vale muito mais a pena investir tempo e energia construindo, daqui pra frente, um relacionamento bacana com alguém, a partir do que você conhece e interpreta dele/dela do que investigar o passado para tentar evitar certas ações ou mesmo investigar o passado para tentar acertar mais rapidamente.
– Não é raro você iniciar uma pesquisa sobre um homem e acabar no perfil da ex namorada dele, tentando descobrir o que eles tinham em comum e qual era o padrão de relacionamento. Isso é bom ou ruim para esta nova relação? Por quê?
Isto se chama INSEGURANÇA! E isto, no geral, é péssimo (pelos motivos descritos acima).
– As postagens na rede social podem levá-la a tirar conclusões antecipadas e, esporadicamente, até erradas? Quais tipos de conclusões? Pode dar algum exemplo?
Sim, conclusões antecipadas/errôneas podem ocorrer. Exemplo: você vê várias fotos da pessoa em festas/baladas e acredita que ele/ela seja super baladeiro(a), quando na verdade ele/ela postou tais fotos apenas porque: 1) os amigos de verdade já estão casados e esta turma baladeira são as pessoas com quem atualmente ele/ela tem tido contato e são as únicas companhias 2) a foto foi postada porque todos do grupo postaram (e não postar significaria “encheção de saco” por parte da turma).
– Por outro lado, o stalking pode também ser uma forma de autoconhecimento? Por exemplo, ao investigar a vida do pretendente a pessoa pode se dar conta de o que ela gosta em um parceiro? O que realmente importa?
Sim, ao estalkear outrem uma pessoa pode discernir o que faz e o que não faz sentido para si, que tipo de parceiro/a deseja ter (em diferentes aspectos). Mas para que isto ocorra, a pessoa deve estar bastante atenta a si mesma, ou seja, ao que sente e pensa enquanto estalkeia, lembrado que ao estalkear ela está sensível ao que ela pensa/sente/interpreta daquilo que vê e fica sabendo. É um momento dela dialogar consigo mesma, com seus desejos e aspirações.
– Na sua opinião, a interação pessoal ainda é a melhor forma de conhecer uma pessoa? Por quê?
Sim. Acredito que absolutamente nada substitui o contato real e pessoal, pois tudo depende da forma como eu penso, encaro, sinto e interpreto a outra pessoa. E isso só acontece de forma mais plena numa interação pessoal. Minhas impressões, sensações e opiniões a respeito de alguém se concretizam de forma mais legítima através do contato pessoal, através da interação com a pessoa em si (mais do que com o que me disseram sobre, ou mais do que eu vi e investiguei sobre a pessoa).
– Sabendo que nossas leitoras não vão parar de “stalkear” futuros pares, queremos indicar os sinais de que ela está exagerando no comportamento. Pode listar alguns sinais de alerta de que o stalking saiu de controle?
Quando o stalking afeta/interfere/atrapalha as execução das atividades cotidianas dela. Ou seja, quando o stalking toma um tempo considerável a ponto de fazê-la ficar stalkeando ou pensando/falando sobre isso a ponto disso diminuir seu rendimento no trabalho, estudo e/ou demais atividades diárias que fazem parte da rotina habitual dela.
PONTOS IMPORTANTES QUE NÃO FORAM CONTEMPLADOS ACIMA:
1) O stalking nada mais é do que uma maneira “moderna” de se ter informações sobre uma outra pessoa. No entanto, este comportamento sempre existiu, em menor ou maior grau, porém de outras formas. Num passado não muito distante, por exemplo, estas informações eram levantadas basicamente a partir das conversas com amigos e parentes, ou mesmo a partir da mera observação da própria pessoa atuando em sua vida. Voltando mais no tempo ainda, antes de namorar alguém era necessário pedir a permissão dos pais dessa pessoa e, portanto, pouco se sabia sobre ela antes do início de um contato próximo. Muitas coisas eram descobertas totalmente apenas na interação com a outra pessoa, apesar de que as informações “básicas” sempre foram de interesse e também eram levantadas (seja via amigos, seja via observação da outra pessoa in loco). Portanto, as redes sociais são meras plataformas que permitem um comportamento social que, no fundo, sempre existiu em algum grau.
2) Usar o stalking como critério decisório para um encontro, por exemplo, é muito arriscado, já que sabe-se que através das redes sociais é possível construir diferentes personagens, que nem sempre condizem com a pessoa na vida real.
3) Muitas pessoas continuam stalkeando durante o relacionamento. Ou seja, fica olhando quais fotos ele/ela curtiu e/ou comentou; quem passou ou deixou de seguir; quais horários esteve no WhatsApp, etc. Este tipo de comportamento é, no geral, bastante prejudicial ao relacionamento, na maioria das vezes gerando muitas discussões, brigas e até separação.
E VOCÊ, O QUE PENSA SOBRE O ASSUNTO?
Um abraço,
Ghoeber Morales