Ontem estive em um lugar. Um lugar pequeno e público, onde tinha a presença da minha família: pai, mãe, irmãos, primos, tios, agregados… Ou seja, pessoas muito queridas pra mim. Somos uma família de risadas altas, apelidos memoráveis, frases de impacto, que só nós entendemos, e também uma família de sorrisos discretos, caras sérias, porém amáveis e com comportamentos característicos.
Estava calor, muito calor! O sol estava escaldante, sendo que ao final do dia eu estava com a pele vermelha e ardendo, de tanto sol. Conversávamos, contávamos novidades, matávamos saudades dos parentes distantes, recordávamos dos tempos da infância… Aquela foi uma oportunidade de reencontro.
Mas nesse mesmo dia eram sorrisos amarelos; nos corações, um aperto; as cabeças pesadas de memórias e reflexões. O calor nem importava. Apesar de quase quarenta graus, o lugar estava frio, desconfortável e angustiante. Esperávamos algo e alguém. Será que estaríamos nos esquivando de algo? Fugindo, talvez? De sentimentos, comportamentos, emoções? Ou nos comportávamos assim, por uma punição anterior àquele dia?
Tenho certeza que ninguém estava sendo recompensado por nada naquela ocasião. Nós, enquanto família, “sabemos” porque nos sentíamos daquele jeito e hoje, quando acordei, comecei a repassar o dia de ontem e resolvi escrever este texto para propor uma reflexão, associada com o que presencio no consultório inúmeras vezes.
Então, vamos lá… Não está um pouco incongruente a descrição do primeiro parágrafo se comparada ao segundo? No primeiro parágrafo, vocês podem notar que parecia um dia de festa, alegria, reencontro e felicidade. Porém, no segundo parágrafo, aquilo que se passava “dentro da pele” das pessoas que estavam presentes, demonstrava que era um dia de tristeza, angústia e sofrimento.
E ai, o que isso quer dizer? Quero dizer que os comportamentos dos seres humanos têm contornos diferentes em diferentes tipos de situações e que durante nossa história de vida e a partir da nossa cultura, aprendemos a interpretar essas formas e explicar esses comportamentos. Como exemplo, observe as seguintes falas: “ – Outro dia vi fulano sorrindo e ele deve estar feliz” ou “ – Fulano adora roer unhas, é muito ansioso”. Porém, nem sempre acertamos nessa interpretação, pois não temos acesso ao que passa por “dentro da pele” das pessoas e muitas vezes não sabemos descrever o que se passa dentro de nossa pele; não levamos em consideração o que a pessoa está vivendo naquele momento, o que aconteceu anterior àquele comportamento e as conseqüências de se comportar daquela forma, ou seja, não levamos em consideração o porquê de se comportar daquele jeito; e acabamos nos equivocando ao interpretar o comportamento do outro (e até mesmo o nosso), não fazendo perguntas como as feitas no terceiro parágrafo.
Já parou para pensar que, como conseqüência dessa interpretação dos contornos dos comportamentos do outro e dos nossos próprios comportamentos, ficamos bravos, irritados, nomeamos o outro como insensível, e muitas vezes até levamos para o lado pessoal? Ou não entendemos nossa forma de comportar e dizemos que estamos assim “do nada”… Comportamo-nos sem explicação?
Eu e minha família estávamos em um velório, de uma pessoa muito querida, amada e respeitada por todos e quem interpretar a nossa forma de comportar, errará no porquê estávamos daquele jeito. Então… já ouviu aquele ditado “Quem vê cara, não vê coração”? Nessa situação ele não vale, pois o porquê do nosso comportamento, no velório, era muito mais explicativo do que o jeito de se comportar. Assim, antes de interpretar os contornos dos comportamentos das pessoas, seria importante que nos perguntássemos pelos porquês dos mesmos. Pense nisso!
Texto escrito pela Terapeuta Comportamental Melissa Rocha, da equipe Ghoeber Morales Terapia & Coaching