Falar sobre amor e relacionamento afetivo é, muitas vezes, arriscado. Afinal, não existe uma regra única, que funcione bem para todos. Se existisse, os consultórios de Psicologia estariam mais vazios, as rodas de conversa no bar se ocupariam com mais frequência de outros assuntos, as DR’s tomariam menos tempo de nossas vidas.
Ainda assim, resolvi no post de hoje falar de amor, mas desde o início alertando que as ideias que seguem abaixo são apenas mais um ponto de vista sobre este tema tão complexo e fascinante. De qualquer forma, espero que a discussão possa lançar luz à novas reflexões e posturas.
Sou terapeuta comportamental há mais de 10 anos e, em todo este tempo, recebi e continuo recebendo adultos brincando de “esconde-esconde”. Não, não estou me referindo àquele jogo no qual as pessoas se escondem e uma delas sai à procura das outras depois de um tempo. Estou falando dos “jogos amorosos” que muitas vezes são criados, principalmente no início de um relacionamento. O de “esconde-esconde” é um deles, bastante frequente.
Ou seja, ainda tenho visto muitas pessoas (homens e mulheres, mais jovens ou mais velhos, de diferentes orientações sexuais) que, no início de um relacionamento, escondem o que realmente pensam ou sentem a respeito do parceiro(a) e de seus comportamentos.
Sim, eu sei que é “natural” (frequente) isto ocorrer, já que por conta de uma série de rótulos e julgamentos que a sociedade impõe (dentre outras razões), ficamos receosos de demonstrar quem realmente somos e o que realmente pensamos e desejamos logo de início. Mecanismo clássico de defesa.
No entanto, vejo que isto tem produzido muita perda de tempo e sofrimento “desnecessário”. É claro que podemos sempre aprender com as situações que não nos são favoráveis, mas não seria melhor se ocupássemos nosso tempo em relações mais maduras desde o início?
A ideia de que “enquanto eu não acho a pessoa certa, vou me divertindo com as erradas” pode até funcionar para muitas pessoas, mas eu sempre fico pensando o quanto seria mais interessante as pessoas se divertirem mais e mais tempo com a pessoa “certa”.
Esta é uma opinião bastante pessoal e você obviamente não precisa concordar com ela. Mas esta ideia em que eu acredito sempre se fortalece quando, no consultório, eu ouço comentários do tipo : “- Ai, graças a Deus agora a situação é outra! Fulano(a) é divertido(a), leve, comprometido(a), educado(a), gentil”, etc. Isso me faz pensar o quanto poderia ter sido uma boa opção se esta pessoa tivesse desfrutado mais tempo de tudo isso com esta outra pessoa (no lugar de ter gastado tempo se divertindo com as “pessoas erradas”).
Novamente, eu sei que a “diversão com as pessoas erradas” pode produzir muitos aprendizados, que geralmente são inclusive utilizados com a “pessoa certa”.
Na minha percepção, parte do que tem produzido esta “demora” em encontrar a “pessoa certa” é o tal jogo de “esconde-esconde amoroso”. Muitas pessoas escondem dos parceiros(as) seus reais valores, gostos, desejos, vontades, opiniões… Esperando que um dia isso possa ser expressado livremente e o outro, então, aceite plenamente.
Penso que se não há uma compatibilidade razoável entre este fatores para os dois parceiros logo de início, as chances do relacionamento engrenar com qualidade são bem menores.
Obviamente que nem sempre vamos encontrar uma pessoa que vá concordar com tudo e gostar de tudo aquilo que somos e fazemos (seria até chato isso, creio eu). Mas, se precisarmos ficar nos escondendo (do parceiro(a) e de nós mesmos) numa relação, a chance dela chegar ao fim (ou então de você se manter nela infeliz) é grande. Não é verdade?
Pode parecer estranho mas eu gostaria que você pegasse um papel, o bloco de notas do celular ou qualquer outro equipamento no qual pudesse fazer algumas anotações. O importante é “tirar da cabeça” e redigir isso em algum lugar.
Agora, faça uma lista, o mais completa possível, com as características do parceiro(a) que você deseja ter. Mas faça esta lista pensando na seguinte pergunta: Se fosse perfeitamente possível você conhecer uma pessoa para se relacionar com ela, como seria esta pessoa?
Descreva características físicas, comportamentais, os valores que você deseja que ela tenha…Enfim, faça uma lista bem completa, pensando em detalhes… Construa esta lista sem ficar preso(a) à pensamentos do tipo: “- Ah, mas este homem/mulher não existe, é uma idealização”.
Meu interesse aqui é que você identifique, com clareza, o tipo de pessoa que realmente faz sentido quando você pensa em compartilhar a sua vida com ela. Não tenha medo de pensar absolutamente nada. Deixe os pensamentos mais sinceros virem à tona. Apenas você terá acesso a essa lista. Mas é preciso que você seja completamente sincero(a) com você.
Agora, o desafio que te proponho é: imagine que, daqui pra frente, você é o/a recepcionista de uma boate bem bacana e que apenas pessoas que cumprem a maioria dos requisitos da lista que você construiu podem entrar nela.
Você já entendeu a minha proposta: daqui pra frente, como seria se você deixar entrar em sua vida apenas aqueles que, de fato, merecem o seu tempo, a sua entrega e o seu amor? O resto… Bem, o resto provavelmente você já conheceu antes…
Talvez você esteja se perguntando: “- Nossa, mas se eu seguir a lista que eu criei não vai entrar quase ninguém na boate”.
E eu te respondo: “- É verdade, muito provavelmente você está certo(a)… Mas arrisco dizer que se você deixá-lo(a) entrar, não vai querer que ele/ela saia nunca mais!”
Para finalizar, um conselho e uma pergunta: esconde-esconde é jogo de criança. Vai jogar até quando?