Querido amigo João-de-barro, estão dizendo que você aprisiona a sua amada no ninho até a morte caso ela te traia. Alguns afirmam, mostram provas e aprovam; enquanto outros dizem que é mito. Seja como for fiquei estarrecido. Eu poderia começar perguntando-lhe o que é traição, ou posse, ou insegurança. Mas existem outras coisas que preciso lhe dizer.
Deixe o amor livre: asas são para voar!
Na nossa vida, que as paredes sejam nada mais que ambiente para quadros, calendários, relógios e poeira no rodapé. Aprisionar não é cuidar, lembre-se! Assim como seu canto é mais belo ares afora, o da sua amada também é.
Simbiose não é amor. Empatia sim.
Manter o ninho aconchegante é essencial, mas que seja tarefa mútua. Não incuta responsabilidades demais, expectativas demais, culpas demais. (Culpas, aliás, de forma alguma!) Tudo que é demais transborda. O voo, por vezes, pode ser solitário, mas não precisa ser triste.
Não pense que você é a gênese de todo o afeto que ela pode receber. Ou que ela é a única fonte de todo o seu carinho. Claro que ao seu lado ela emana alegria. Mas por mais que doa, entenda: sem você, antes de você e além de você ela existe. O amor próprio a faz assim. Forte assim. Não venha fazer disso motivo para sugar os sentimentos que ela tem. Permita que ela se ame e a ame por isso. Não dizem que quem não ama a si mesmo não pode amar mais ninguém?
Ninguém é tão superior a você que deva carregar nos ombros a tarefa de lhe resgatar da solidão; ninguém é tão inferior a você que deva se submeter.
Manter o encanto vivo e a amada segura não é o mesmo que erguer paredes. No barro duro e seco, que cerceia, o encanto não floresce, não frutifica e não amadurece. Pelo contrário, ele morre. Vira dor. E mais que o barro, a dor aprisiona: ela e você. Então, ao menos construa portas e janelas nas suas paredes. Deixe o ar entrar. Deixe sair. Não dizem que o tempo vai e o vento vem? Seja confiante, meu querido amigo. Alguém muito carente não ama, aprisiona.
Ciúme não é respeito. Liberdade sim.
Ah, não esqueça a cautela ao escolher a árvore para construir seu ninho: que não seja alta demais, baixa demais, frágil demais, dura demais. Haverá tempos de chuva; então absorva. Ventos fortes virão; flexibilize. Quando o sol for intenso; seja sombra. E não se esqueça das suas raízes: elas devem ser seguras e profundas. Pois você bem sabe: todos nós temos raízes. Você, eu e a sua amada. Não lhe peça para abrir mão delas. Entrelace-as às suas.
Finalmente, se nada disso fizer sentido pra você, sinto lhe dizer querido amigo: ela vai voar. Você acredita que ela veio do barro e para lá deve voltar. Mas veja: há muito ela não é aquela massa que você molda à sua imagem e semelhança.
E você, querida amiga, voe!
Seja o amor livre: asas são para voar.
TEXTO ESCRITO POR SAMUEL SILVA | TERAPEUTA COMPORTAMENTAL E COACH DA EQUIPE GHOEBER MORALES TERAPIA & COACHING